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As propriedades rurais no Brasil devem ter um limite de tamanho?

Por Raquel Rolnik*

Desde o dia 1º até o dia 7 de setembro, várias organizações e movimentos sociais estão nas ruas realizando um plebiscito sobre o tamanho das propriedades rurais no Brasil. Organizada pelo Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo, a Campanha Nacional pelo Limite da Propriedade da Terra coloca para a sociedade a seguinte questão: as propriedades rurais de terra devem ter um limite máximo de tamanho?

De acordo com os organizadores da campanha, o Brasil tem a segunda maior concentração fundiária do planeta. 2,8% das propriedades rurais ocupam mais da metade da extensão territorial agricultável do país (56,7%). Já as pequenas propriedades representam 62,2% dos imóveis e ocupam apenas 7,9% da área total. Os dados são do IBGE, referentes ao ano de 2006.

Outra questão importante tem a ver com a produção de alimentos. A maior parte dos alimentos produzidos para consumo interno no Brasil provém da agricultura familar, enquanto o agronegócio produz principalmente commodities: soja, cana de açúcar e eucalipto para exportação, sendo um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo.

Além disso, conforme lembrado pela FASE em editorial em seu site, este debate “tem obrigatoriamente que passar pela questão ambiental. Não é mais possível negar que as imensas extensões de terra que são propriedade de grandes fazendeiros ou mesmo de empresas transnacionais eram, tempos atrás, os biomas brasileiros que agora estão sob ataque. Amazônia, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga, Pampa.”

“Sem floresta, sem cursos d’água, sem a biodiversidade, ficará cada vez mais difícil para todos nós a manutenção de uma qualidade de vida digna. Já se notam mudanças climáticas grandes e pequenas que, ainda que não tenham comprovação científica cabal, a prudência recomenda ouvir o senso comum que identifica claramente a insensatez ambiental como a causa de secas prolongadas em alguns lugares e enxurradas em outros.”

Para saber mais informações sobre a campanha e conhecer os locais de votação, clique aqui.

* Raquel é urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e relatora especial da Organização das Nações Unidas para o direito à moradia adequada.

Fonte: Blog da Raquel Rolnik

Minha Casa, Nossa Dívida

“De modo matreiro, a massiva propaganda oficial olvida que o programa burla a lei de licitações, ao gastar dinheiro público com obras contratadas sem licitação”

Oswaldo Martins Rizzo*

“A história é uma galeria de quadros onde há poucos originais e muitas cópias”(Tocqueville)

Devagar com o andor que o Brasil passa tão-só por outra fugaz expansão propiciada, notadamente, pelo insustentável ciclo de crédito pessoal pré-eleitoral financiador do consumo que findará com a explosão da inadimplência, pois a massa salarial continua inelástica. Para o Banco Central (BC), 20% dos brasileiros tem dívidas equivalentes a quatro vezes a renda média nacional mensal.

Preocupado com os ruinosos efeitos eleitorais da mega crise financeira global de 2008, o governo federal trocou os superávits fiscais neoliberais por déficits orçamentários aquecedores de demandas, minimizando a recessão. Adaptando o receituário neo keynesiano aos trópicos e pressionadas pelos lobistas, as autoridades escolheram negócios como meritórios para ganharem incentivos oficiais.

A indústria da construção civil foi contemplada, sendo um dos prêmios o programa de habitações populares batizado de “Minha Casa, Minha Vida” (MCMV), movido a farto crédito pessoal subsidiado e renúncia fiscal para complementar o insuficiente poder aquisitivo dos salários. Injetora de recursos públicos, através da Caixa Econômica Federal (CEF), e sem exigir contrapartidas empresariais, a ação governamental acalmou a histórica lamúria das fabricantes de materiais de construção e construtoras de que a causa una das agruras do setor é a escassa oferta de financiamentos para a compra de insumos e imóveis, provida pelos bancos privados.

Em 2009, financiou-se 669.809 moradias de vários tipos batendo o recorde de 627.342 unidades alcançado em 1980 pelo fenecido Banco Nacional de Habitação (BNH), criação política para acalmar queixas poucos meses após o golpe militar de 1964. Para o então ministro do Planejamento, Roberto Campos: “o proprietário da casa própria pensa duas vezes antes de se meter em arruaças ou depredar propriedades alheias e tornar-se um aliado da desordem”. A corrente rompeu em 1984 quando, sufocados pela alta de 190% nas prestações, 53% dos mutuários ficaram inadimplentes quebrando o banco que fechou quatro anos depois ao transferir seus ativos podres para a CEF.

De modo matreiro, a massiva propaganda oficial olvida que o MCMV burla a Lei de Licitações (n° 8666/93), ao gastar dinheiro público com obras contratadas sem licitação. O logro baseia-se na Medida Provisória 1823/99 da gestão FHC, que permite à CEF contratar obras executadas com recursos públicos sob regras próprias, isentando-as de seguir os ditames da Lei 8666/93. O interino instrumento hipo legal permite, ainda, que a CEF mantenha as contratações durante o período eleitoral garantindo, assim, as benesses eleitoreiras das inaugurações de conjuntos habitacionais populares.

Adotando esse rançoso expediente, novamente, o governo cedeu à atuação lobista do cartel das grandes construtoras promovendo uma sideral concentração setorial ao transferir a maioria dos polpudos recursos públicos para poucas e grandes empresas, avaliadas pela CEF com base apenas nos seus fluxos de caixa e nas certificações de qualidade no PBQPH (Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade no Habitat) emitidas por inconfidentes agentes certificadores.

Todavia, financiar a compra de moradias relativamente caras para assalariados mal remunerados e muito endividados expõe a um maior risco de crédito os estoques dos ativos das fontes de recursos do MCMV – o Orçamento Geral da União (OGU) e a poupança compulsória dos trabalhadores celetistas (FGTS e FAT) – podendo, no médio prazo, gerar um novo passivo (“esqueleto”) bancado por todos os contribuintes brasileiros.

No começo da década passada, numa ação pré-eleitoral de extirpação do balanço da mesma CEF dos ativos com altíssimo risco de crédito gerados pelos financiamentos habitacionais concedidos a mutuários sem condições de honrá-los – possibilitando, assim, que se enquadrasse nas regras do Programa de Fortalecimento das Instituições Financeiras Federais-, o governo FHC criou a Empresa Gestora de Ativos (Emgea) uma espécie de banco público com ativos podres que absorveu os créditos imobiliários da CEF relacionados aos contratos dos devedores inadimplentes.

Mensalmente, a Emgea contabiliza um déficit superior a R$ 200 milhões assumido pela União, ou seja, quem arca com a inadimplência de alguns mutuários são todos os brasileiros que pagam impostos, pois o dinheiro do Tesouro Nacional sai do bolso do contribuinte. Desde a sua criação, a Emgea acumula um prejuízo maior que R$ 10 bilhões que, para ser compensado no futuro, exigirá um chamamento de capital do “sócio passivo”, ou seja, o contribuinte brasileiro com mais aumento na carga tributária e inflação. O MCMV pode gerar outra Emgea.

*Osvaldo Martins Rizzo é engenheiro e ex-conselheiro do BNDES

Quem Ocupa terras?

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CYNTHIA MARIA PINTO DA LUZ – Advogada do Centro de Direitos Humanos de Joinville – cynthiapintodaluz@terra.com.br

Quando ocorre um movimento de ocupação de terras, a mídia anuncia negativamente e, geralmente, provoca forte reação contrária ao movimento, que pressiona em busca de uma reivindicação de caráter constitucional, o direito à moradia.

Nas últimas décadas, Joinville foi foco de intensa migração. Os governos municipais incentivaram a vinda de mão-de-obra sem preocupação com o crescimento da cidade. Pelo contrário, foram coniventes com a especulação imobiliária, contribuíram na depredação do meio ambiente e utilizaram a concessão desregrada de lotes para fins eleitoreiros.

Hoje, a cidade sofre vitimada pelas enchentes, desabamentos, sem planejamento urbano e com um déficit habitacional de 17 mil moradias. Apesar dos projetos desenvolvidos pela nova equipe da Secretaria de Habitação, é impossível estabelecer uma política rápida e eficaz, que dê conta da demanda em pouco tempo.

Contudo, a ocupação de terra continua sendo, como antes, uma necessidade de famílias que não suportam os gastos com aluguel, com o pagamento do lote para as imobiliárias ou mesmo que não têm onde morar.

Quem ocupa terra é a família que está em condições de miserabilidade, excluída do processo social e que se submete à insalubridade, viver sem banheiro, em barracos de lona ou construídos precariamente e, pior, conscientes da injustiça de não ter onde morar e dos riscos que a situação acarreta. Se existem pessoas que querem se aproveitar deste processo, não é a maioria e devem ser afastadas.

Por isso, é preciso enfrentar esta questão com a seriedade que merece. Os problemas de moradia fazem parte do cotidiano das cidades e ameaçar famílias carentes, crianças e pessoas idosas com a polícia não é aceitável.

A reivindicação de movimento social não é caso de polícia e o Poder Público tem o dever de saber lidar com a situação, qualificando esta relação, abrindo canais de interlocução com os movimentos e suas lideranças, monitorando as necessidades nos bairros, comprometendo a população com seus projetos.

Um governo democrático deve adotar as propostas históricas na luta pela moradia, comprometer-se com a defesa de princípios constitucionais, pois tratar famílias como criminosos não resolve o problema de moradia de Joinville.

"Joinville não tem favela"

“Joinville não tem favela. É o município que mais arrecada no Estado, mas a maior parte não fica aqui”.

As palavras do então prefeito Luiz Henrique da Silveira (PMDB) foram proferidas a mais de10 anos, mas mesmo assim, já tinham validade na época. O bairro Jardim Paraíso acumula, hoje, 26% das áreas de ocupação (vulgarmente chamadas de invasão) de Joinville. A maioria daquelas pessoas está lá há 15 anos, muito antes de LHS dizer que a cidade não tinha favelas.

O A Notícia de hoje publicou interessante levantamento sobre áreas de ocupação em Joinville. São mais de 3 mil famílias em áreas irregulares, a maioria em bairros da zona leste.Vejam no link abaixo a reportagem e os números.

http://www.clicrbs.com.br/anoticia/jsp/default2.jsp?uf=2&local=18&source=a2579402.xml&template=4187.dwt&edition=12708&section=885